Por Olivier Liron
Antes que o céu desabe, de Maiara Gouveia, pode ser lido como um convite magistral para abraçar o mundo de outro modo, poeticamente, para além da oposição significativa na história ocidental entre natureza e cultura.
O ensaio da autora começa por recordar magnificamente a articulação entre a ação predatória das sociedades ocidentais face à vida e as terríveis devastações da violência social e histórica. Escritora e poeta, Maiara Gouveia não fala somente na condição de especialista e ativista, mas como leitora apaixonada; ela soma à sua singular reflexão uma profunda curiosidade pela diversidade da vida, como a das formas animais, de cobras, ofídios, cogumelos, corvídeos e outras aves, numa reflexão que é ao mesmo tempo política, cósmica e telúrica.
Jogando com as proximidades sonoras e semânticas entre “homem” e “húmus”, seu texto clama por uma nova comunhão com o mundo terreno.
Na linha de Bachelard, questiona nosso imaginário acerca dos elementos e nos convida a desconstruir representações herdadas de uma epistemologia cega e destrutiva. A filosofia do outro, o xamanismo e a belíssima ideia de “revoluções invisíveis” completam este texto intenso, entre manifesto ecofeminista, ensaio antropológico documentado e reflexão poética. Aberto a todos os céus da realidade e do conhecimento, Antes que o céu desabe é um grande prazer de leitura, mesclado à imensa erudição de Maiara Gouveia!
Por fim, como escritor e poeta francófono, como não ficar sensível ao convite da autora à releitura de grandes textos da poesia portuguesa, como os de Alberto Caeiro, que escreve:
“Não sei o que é a Natureza: canto-a. / Vivo no cimo dum outeiro /Numa casa caiada e sozinha, /E essa é a minha definição.”
Afinal, quem sabe uma nova filosofia da vida passe, também, por devolver seu lugar à poesia, linguagem do sensível?* leia aqui o original, em francês | + informações biográficas aqui e aqui
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Olivier Liron é escritor, poeta, pianista e professor de literatura.
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