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UM ESTADO DE POESIA

Por Lau Siqueira


Berço de Augusto dos Anjos, a Paraíba possui uma tradição muito ampla na Poesia. Lugar de cantadores como Inácio da Catingueira e Zé Limeira. Drummond chamava o cordelista Leandro Gomes de Barros de “o príncipe dos poetas”. A tradição da poesia popular não pode ser subestimada na terra de Zé da Luz e Chico Pedrosa.


Aqui nasceu Zila Mamede, poeta maiúscula. Vejamos o seu poema “A Ponte”: “salto esculpido/ sobre o vão/ do espaço/ em chão/ de pedra e de aço/ onde não/ permaneço / - p a s s o.” Veja a força absoluta da imagem. Aqui se produz arte popular e erudita com grande qualidade. A Paraíba é um dos respiradouros artísticos do Brasil e tem na Poesia o seu sotaque primordial.


Atendendo uma provocação da Editora Casa Verde reunimos uma das nossas seleções. Convenhamos, são muitas. Traçamos um amplo recorte da poesia paraibana contemporânea partir dos poetas da Geração Sanhauá (final dos anos 70). Poetas nascidos e nascidas, residentes ou que deixaram a alma por aqui. Poetas jovens, poetas mais experientes. Do Cordel ao neobarroco. Todos e todas ainda vivos e vivas.


A pesquisa afunilou-se e fez transbordar tanto poema, tantos e tantas poetas que já podemos pensar num segundo volume. Ainda que as escolhas jamais sejam fáceis, pois invariavelmente sempre corremos o risco de alguma omissão injustificada. Afinal, ao escolher um caminho, deixamos de trilhar outros tantos.


Neste “horizonte mirado na lupa”, buscamos alargar o alcance do olhar sobre a poesia que é feita na Paraíba atualmente. Sem impor fronteiras de qualquer espécie. Não se trata de escolher os melhores e as melhores, mas de perceber o quanto somos imensos, diversos e inclassificáveis.


Não tenhamos dúvidas, a poesia da Paraíba está entre as mais consistentes e diversas do país. Foi necessário reconhecer neste livro, por exemplo, o crescimento do número mulheres escrevendo e publicando. Consideramos que da antologia “Geração 59” para cá, apenas uma mulher havia sido selecionada em antologias paraibanas. Isso, sabemos muito bem, não é obra do acaso.


Seria infame ignorarmos o nascimento de uma literatura indígena de forte apelo ancestral. Buscamos o segmento na origem e por isso incluímos também Eliane Potiguara. Uma pioneira da literatura indígena brasileira cuja família foi brutalmente arrancada do litoral norte da Paraíba. Buscamos e encontramos a literatura Calon, dos povos ciganos do Sertão, mas por conta de algumas questões paralelas fica para um possível segundo volume.


Por saber que a poesia é um cenário em movimento, alternamos a a consagração com os primeiros passos. Misturamos poetas com muitos livros com quem sequer reconhecia como poesia a sua escrita. Escritores publicados em grandes editoras, premiados e premiadas, com escritores e escritoras cujas publicações até hoje se limitavam basicamente às redes sociais.


Claro que nomes importantes ficaram de fora. Todavia é impossível e desnecessário o fechamento desta porta. Esta antologia é uma provocação. Afinal, a ideia é exatamente ampliar o leque fora do eixo. Direcionar a lupa para os rincões, para as aldeias, para os quilombos e os ranchos ciganos que nos ajudam a resistir ao fascismo dos nossos dias. Neste sentido, me alegra a cartografia das escolhas feitas.


Ao rastrear a produção paraibana, sei do tanto que me escapou entre os dedos. Optei pelo rigor e pela representatividade, mas sem rigidez. No mais, desejo que nunca as escolhas no campo literário esbarrem em questões raciais, de credo, orientação sexual ou qualquer elemento de sustentação desta sociedade patriarcal, machista, racista e homofóbica que precisa ser superada.


Para isso a poesia é esse barco em alto mar e com ela vamos transbordando no oceano do mundo. A Paraíba é um abraço aberto ao mundo. Um eterno campo de interpenetrações, trocas e mutações. Por aqui circulam artistas, escritores, escritoras de diversos mundos e foi com este olhar que miramos o horizonte com a lupa ampliada da história. Cientes do muito que ainda precisa ser feito e será.


No mais, contamos com o luxo das ilustrações do artista plástico paraibano Flávio Tavares cujo traço e cores dizem tanto das razões de cada poema. Também contamos com o projeto gráfico e a capa do competente Auracébio Pereira e com a coordenação editorial da jornalista, documentarista e escritora Laís Chaffe.


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